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sábado, outubro 31, 2009

O caso do vestido



Fonte: http://useloos.com/gallery/?itemid=114



Nossa mãe, o que é aquele
Vestido, naquele prego?


Minhas filhas, é o vestido
De uma dona que passou.


(Carlos Drummond de Andrade)


Era caso, no máximo, para cair nos patrulhamentos de estilo e aparência, nos reality shows que proliferam vendendo a ilusão de que todos podemos nos adequar esteticamente aos padrões vigentes sacando o cartão de crédito e transformando em beleza certificada a abstração do dinheiro. Era isso, no máximo. Mas virou questão de segurança, e a polícia teve que escoltar Geyse Arruda em sua saída da universidade.
A cena gera muitas questões, apesar da sua aparente banalidade (ou não?). A extravagância – ou apelo à sensualidade – da moça foi punida com uma reação em cadeia. Nos programas de TV e de rádio, foi expediente comum os jornalistas incentivarem estudantes da Uniban, ou mesmo os ouvintes e espectadores, a se manifestar sobre o assunto. Era caso para isso? Obviamente, não poucos tentaram justificar o ocorrido comentando a inadequação da vestimenta da moça. Então, vamos a isso primeiro.
Muito se fala do poder e da liberdade da mulher contemporânea, em suas conquistas quando comparamos o papel social feminino em relação ao que já foi anteriormente. Mas em um aspecto, creio, a mulher ainda sofre as mesmas cobranças – talvez mais – do que no passado: a sua aparência. As “maravilhas” da ciência, parece, vieram complicar um pouco as coisas... Diariamente nossos olhos são invadidos por “modelos de perfeição” inatingíveis, corrigidos pelas mãos de esteticistas, maquiadores, cirurgiões, editores de imagem e por aí vai. Desde pequenas, assistindo a programas de televisão, vendo as revistas em bancas, as meninas espelham-se em imagens de garotas que nunca têm um fio de cabelo fora do lugar, nunca transpiram, nunca engordam... Quando enfrentam as mudanças da adolescência, é fácil que se sintam frequentemente inadequadas e queiram se aproximar daqueles modelos. “Magra, linda e feliz” é o que as revistas de fofoca colocam como subtítulo das fotos das “mulheres bem-sucedidas” em destaque na mídia. Toda essa digressão porque a imagem de Geyse Arruda nos noticiários conota um esforço para enquadrar-se nesse padrão, que se opõe à ideia de “beleza natural”, “espontânea”. O desejo de ser bela, poderosa, provocante – como qualquer adriane galisteu dos shows televisivos – parece ter moldado o figurino da estudante.


De um lado, a femme fatale que, vestida para a balada, abalou. De outro, os colegas e funcionários da faculdade que hipocritamente se sentiram no direito de mostrar (ou forjar) indignação. Se ela existisse, seria porque todos consideravam que se vilipendiava um sagrado templo do estudo. Pois é, o que inviabilizaria o coro de gritos e palavrões, e o tom geral de “estamos matando aula” dentro do referido “templo”. Talvez, de forma injusta, eu vislumbre nesse ato de vandalismo o indício de um respaldo da universidade ao comportamento dos alunos, ou melhor, clientes. A educação, tratada como mercadoria, tem recebido o aval oficial do Ministério da Educação, que observando o fracasso do ensino fundamental e médio nas escolas públicas, faz vistas grossas aos “atacadões” de ensino superior particular. É como se fosse um pacto: nós, universidades particulares, oferecemos preços razoáveis e deixamos todos os jovens (que puderem pagar) ingressar em nossos cursos, sem exigir qualquer competência acadêmica prévia; vocês, do governo, fingem fiscalizar nossas práticas. E dá-lhe demissão de professores doutores após reconhecimento do curso, dá-lhe bibliotecas “alugadas” para agradar ao MEC, dá-lhe ausência de planos de carreira para funcionários e esquemas de facilitação para manter os alunos ativos, pagando mensalidade. Não admira que o ocorrido demonstre o quanto os nossos jovens estejam incertos sobre o sentido da educação, do respeito e da democracia.

6 comentários:

GG disse...

Dava um poema do Del.

Fábio Aristimunho disse...

Lamentável o acontecido, e ainda mais lamentável que sirva como termômetro para mensurar a baixa qualidade do ensino superior privado.

Talitha Borges disse...

Além de todas essas questões colocadas e conclusões tristes a q se chega, o q me chamou atenção foi o poder de mobilização desses estudantes no momento do ocorrido, a ponto de expulsarem a garota do local e pensar q tamanha mobilização poderia ser utilizada para coisas q realmente fariam diferença em nossa sociedade... Temos os ovos, a farinha e fermento, mas prefere-se brincar de torta- na- cara- um- do- outro....

André Braga disse...

O (des)caso Uniban(do)

http://mundoid.blogs.sapo.pt/46501.html

André Al.

Pablo Treuffar disse...

um mundo de hipocritas

Renato Pedreira | Itaú Cultural - Comunicação Dirigida disse...

Olá colegas do blog O Casulo!

Gostaria de enviar um convite/informativo do edital Rumos Literatura do Itaú Cultural.

Trata-se de um programa nacional de incentivo a produção e crítica literária que já está com o período de inscrições em aberto.

Para tanto, peço que me passem um e-mail de contato.

Grato.

Renato Pedreira | Itaú Cultural - Comunicação Dirigida
renato@comunicacaodirigida.com.br