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sábado, março 31, 2007

Os excluídos dos "excluídos"

por Andréa Catrópa


Na última sexta-feira do mês de março, mais especificamente ontem, foi realizado aqui em São Paulo o debate Caminhos da Literatura Contemporânea. A mesa foi composta pelos professores Jorge de Almeida, Roberto Zular e Ana Paula Pacheco e pela editora Camila Diniz, com mediação do poeta Frederico Barbosa.
Apesar dos vários pontos interessantes e provocativos levantados na ocasião, algo me chamou a atenção durante a fala da Professora Ana Paula Pacheco. Ao discorrer sobre alguns aspectos daquilo que se convencionou chamar de Literatura Marginal (expressão aplicada à prosa de autores como Paulo Lins e Ferréz), também usou o termo “literatura dos excluídos”. Este termo foi o que me incomodou, talvez porque eu já entenda o termo “marginal” como um rótulo que por força do uso acaba dissimulando suas contradições.
Mas fiquei pensando, sem nenhum cinismo, quem são os excluídos? Um dos exemplos dados foi a Irene, do poema “Irene no céu” que, se não me engano, foi considerada representativa da passividade dos “excluídos” na literatura modernista. No entanto, o poema antes me parece mostrar o ponto de vista carregado de afetividade de um privilegiado, que talvez expie um pouco de sua culpa ao imaginar que, pelo menos no céu, Irene teria uma recepção digna. Considero que o exemplo dado da prosa de Alcântara Machado seria mais adequado à representação textual da voz de uma parcela da população marginalizada pelas classes altas.
No entanto, quando pensamos em um contexto contemporâneo, o que definiria o “excluído”: a etnia, a situação econômica, a profissão, o sexo ou a opção sexual? Qualquer uma desses fatores (por exemplo, ser prostituta), ou apenas quando aparecem combinados (ser prostituta negra)? E um indivíduo pode ser “excluído” no plano social (negro) e “incluído” na esfera literária (escritor reconhecido)?
Confesso que acho problemática a visão do ”excluído” estar sendo representada principalmente por homens heterossexuais, brancos ou negros. Já que estamos com um pé nos estudos culturais, onde se escondem as outras minorias? Porque isso me faz pensar: cadê os índios? E as mulheres da periferia, que sofrem com a discriminação misógina de muitos rappers e outros artistas que supostamente são os porta-vozes dos desprivilegiados? Eles e elas existem. Provavelmente fora do mapa literário.

6 comentários:

Anônimo disse...

oi, mujer!

difícil tudo isso.

prefiro partir de outra chave, que é parecida ao discordar, mas talvez outra - no caso, acho que a questão seria o conteúdo/forma ("a voz", hahá) dessa produção: como são os valores absorvidos ali?, se há algum questionamento ou é mera mudança de cenário?, pois a dificuldade maior está em exatamente igualar todos os autores como se fosse simplesmente idênticos, ponto de vista bem discutível esse da uniformização pelo rótulo da "marginalidade".

há muita diferença entre um livro de certo autor e outro e essa leviandade é que acho bem complicada - alguém que é um líder comunitário, reconhecido por sua vizinhança, é "excluído"? faz sentido trabalhar com esse conceito de "literatura dos excluídos"? para que serve o conceito senão para o colocar de forma contrária à "alta cultura"? para o colocar como exceção? a quem beneficia a separação?

não sei se consegui fazer as perguntas, mas creio que esses rótulos servem para pacificar e depois impor pontos de vista bem perigosos.

em todo caso, mulheres são sim colocadas de lado e estão longe de serem uma minoria.

é importante discutir até para se chegar a algumas conclusões.

beijos

ps.: e como diria o raymond williams, culture is ordinary.

Anônimo disse...

ffffff

Anônimo disse...

Infelizmente minha fala foi bastante distorcida pela editora Andréa Catropa. Entendo que ela deseje falar contra o multiculturalismo norte-americano. Mas descontextualizar minha fala para reivindicar a presença de "outros excluídos" no mapa literário não vale. Aliás, minha fala não saudava a representação atual dos excluídos, mas pontuava uma questão histórica, ou histórico-literária, i. é, a presença de um material recorrente, a ser estudado em suas diferentes formalizações (propus justamente a necessidade de diferenciar aquilo que normalmente vem sob o rótulo de "literatura marginal"). Quanto ao poema de M. Bandeira, lido em comparação com um trecho de Cidade de Deus em que encontro um poema em prosa, disse que a fala de Irene ("-Licença, meu branco") trazia marcas de nosso passado colonial escravocrata. Mesmo no céu, Irene "sabe seu lugar", mesmo ali não há supressão das diferenças de classe - o que é uma representação curiosa de nossa história. Na comparação, observei a impossibilidade, na literatura atual (esta sim uma hipótese que fiz), de um olhar condescendente ou, para usar a expressão de Andréa, "afetivo", sobre as classes baixas. Ou seja, ressalta, na ficção brasileira contemporânea, a violência que não deixa espaço para a outra violência, a da cordialidade da elite. Pena a editora não ter feito nenhuma observação durante o debate, pois seria uma oportunidade de gerar discussão, e de evitar comentários distorcidos.
Em tempo: quando a editora escreve "já que estamos com um pé nos estudos culturais", gostaria de não me incluir no plural, se ela me permitir...
Ana Paula Pacheco.

Anônimo disse...

Com todo o respeito, sem entrar muito no assunto: certamente Bandeira não cogitou nada disso quando colocou na fala de Irene o "Licença, meu branco".

Há de se, um dia, pensar o poema em si: que nada se vende às problemáticas multi, pan ou pluriculturais.

Apesar de Bandeira, de qualquer modo, não ser o melhor exemplo para o que se pensa como poética.

Anônimo disse...

Cara Ana Paula,

a referência a seu nome se deu no meu texto justamente para que ninguém lesse minhas reflexões como leviandades. Quis mostrar que foi mesmo o debate me estimulou a fazer tais considerações.
Acho que deixei claro que eu não estava reproduzindo textualmente sua fala. Entre o que pensamos dizer e, do outro lado, o que pensamos escutar, muito se perde. O que escrevi foi baseado no que ouvi - em tudo o que isso tem de objetividade e subjetividade.
De qualquer forma, a segunda parte do texto não se restringe a questionar sua fala. E a questão dos estudos culturais (mais informações perdidas) é só uma auto-ironia...
Mas fico feliz que o debate, tão animado no dia, ainda não tenha se esgotado. Obrigada pelos comentários!
Andréa

Lunna Guedes disse...

Acho interessante e um tanto conturbado. Hoje em dia preocupa-se demais com palavras e cada vez menos com ações.
Excluídos??? Bem a literatura sempre gerou excluídos e vai gerar sempre. O que podemos dizer de Emily Dickinson? A poeta norte-americana que não se encontrou no estilo literário de sua epoca. Não era uma excluída? Independente de cor, raça e crença? Pelo amor dos deuses - não vamos nos ater a detalhes de transcrição. A Arte não merece essa questão.
A arte merece compreensão mediante os termos da inclusão ou exclusão. Cria-se grupos, fragmenta-se que você não se enquadra no estilo que eu desenvolvi, então não convido você ao meu mundo, ou seja, você não vai lá no meu barraco e eu não vou no seu.
Ou será que Monteiro Lobato não se sentiu excluído ao transcrever sua feroz crítica contra os modernistas? Burgueses paulistanos.